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Publicado: 08/09/2010 em Livro das Vozes

Mais um dia comum. Seu despertador o acorda às oito horas como sempre. Sente sono. Cairá no sono lá pelas duas da manhã. Silêncio no pequeno apartamento. Apenas um dia comum. Banho, café da manhã, leitura matinal. Desce as escadas. Nunca usa o elevador para descer. Um “olá” para um vizinho. Outro “olá” para outro vizinho. Não lembra seus nomes, nem mesmo se esforça para lembrar. Apenas um “olá” está ótimo. Para ele aqueles vizinhos existem apenas por aqueles pequenos segundos. Três segundos. Os vê todos os dias, mas eles existem apenas dentro daqueles pequenos segundos. Um “olá” com um pequeno sorriso no rosto. Não podemos esquecer o sorriso. Não importa como nos sentimos. Dizemos “olá” com um pequeno sorriso, que, como estes vizinhos, deixam de existir assim que passamos pela pessoa cumprimentada. Chega ao metrô. Às vezes tem lugar para se sentar. Às vezes não. Toma um livro em uma das mãos. Avança pelas paginas, vivenciando uma aventura que toma a atenção de sua mente. Faz com que não perceba direito o tempo passar. As pessoas do metrô, assim como os vizinhos, são seres relativos. Nascem assim que passam pela porta do metrô e seus olhos os percebem. Voltam para a inexistência assim que desembarcam em suas estações.
Estação Sé. Desembarquem pelo lado esquerdo do trem.
Chegou. Centenas de pessoas desembarcam juntas. Cada um com seu destino, seus interesses, mas, naquele momento, estavam juntas, mas totalmente individuais. Um grupo sincronizado de individuais. Anda em direção as escadas. A sua frente está os trilhos que levam trens no sentido contrario ao seu. Um olhar de relance. Uma simples passada de olhos inocente e a vê. Parada, do outro lado da plataforma, individual em seu grupo. O tempo para de correr e passa a caminhar a passos de lesma preguiçosa. Ela olha impaciente para o túnel do metrô que, para o seu alivio, já está chegando. Olha para frente. O vê também. O trem entra na estação. Seus olhares se cruzam. Vê nos olhos dela algo que ainda não consegue explicar. Não sabe por que nem como, mas a sente de forma extremamente agradável. Passa amá-la. E vê seus olhos brilharem também. Vê que ela também passou a amá-lo. Seu coração da um salto. Abre suavemente a boca para dizer algo que não sabe o que. Tenta estender o braço mesmo sabendo que não a alcançará. O metrô tampa a sua visão. Tenta vê-la através das janelas do metrô. Está muito lotado. A perdeu. As pessoas que desembarcaram do seu trem ainda passam a sua volta, dirigindo-se para os seus destinos. O metro apita. Fecha as suas portas. Parte com ela. Ao sair, traz além do vento, sua mente de volta ao tempo real. Tudo ocorreu em apenas treze segundos. Em apenas treze segundos aprendeu a amá-la e a desejar mais que muitas coisas que as pessoas julgariam de extrema importância, como carros, casa, filhos, felicidade. Mas ela partiu. Assim como as pessoas a sua volta, foi em direção ao seu destino. Abaixa a cabeça. Nunca mais irá vê-la novamente. Sabe disto. Seu corpo foi para a inexistência junto com o metrô e todo aquele grupo de individuais. Busca algo para olhar a sua volta. Não a deixará cair totalmente na inexistência. Ela sempre existirá em sua mente. Nunca irá esquecê-la. A garota que o fez amá-la em apenas treze segundos. Toma o seu caminho. Assim como a garota que acabará de aprender a amar, tem seu destino. Apenas mais um dia incomum.

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